Um dia, as roupas entraram na loja e começaram a experimentar as pessoas. Eu permaneci a olhar aquelas pessoas que um dia foram boas a ficar distantes e agora eram manequins vivos, de todas as cores, modelos e feitios. Algumas pareciam ainda estar em saldos ou serem da coleção primavera-verão. As que não se encaixavam…
Autor: tiagoalvescosta
“A Boca no Ouvido de Alguém” – Antologia de Poesia em Língua Portuguesa
Acaba de ser lançada pelo selo editorial Através Editora a antologia “A Boca no Ouvido de Alguém”, um projecto coordenado por mim e motivado pela vontade de unir desde a Galiza as linhas criadoras que se fazem atualmente no mapa dialogante e de afetos da(s) lusofonia(s). Representa a urgência de nos deixarmos levar pela correnteza…
Esta dura realidade onde tropeçamos
Doutor, antes de medir a minha exaltada pulsão pela vida, deixe-me primeiro mostrar-lhe quanto tempo demorei hoje a chegar aqui. Eu sei que é um assunto com escasso teor científico, e por isso não vou contar-lhe os minutos que perdi a procurar um lugar para estacionar, nem a procurar um corpo que me desse trabalho….
A absoluta ignorância pelas coisas
E ra uma manhã de segunda-feira. Ele estava sentado no seu quarto do acanhado terceiro andar partilhado por mais cinco pessoas, três delas eram uma família. Estava a olhar pela janela e a pensar no murmúrio da avenida. Quantos mais haveria como ele? No Centro de Emprego, o seu estado de vida era claro: desempregado….
O tempo das “Não-Coisas”. E o uso excessivo das redes sociais segundo Byung-Chul Han
Agarramos o smartphone, verificamos as notificações do Instagram, do Facebook, a última polémica no Twitter. Logo respondemos às mensagens do WhatsApp, e, como se de um hipnotismo se tratasse, deslizamos de novo o dedo num gesto quase litúrgico sob qualquer outro aplicativo. Entretanto, tentamos iniciar uma tarefa mais “digna”, mas, sem darmos por isso, estamos de…
O homem que apanhava flores
Um homem, enquanto apanhava flores, provocou uma grande guerra. Porém, enquanto os exércitos organizavam fileiras, o homem tentava explicar: eu só apanhava flores. Entretanto, chegou um prospector imobiliário e perguntou: quem andava a apanhar flores no meu terreno? E o homem, que apanhava flores, levantou o braço com a serenidade de uma criança. Acresce que…
O homem que se dedicava a ser despedido
Ganhara tanto dinheiro com os seus próprios despedimentos que passou a dedicar-se a tempo inteiro a ser despedido. Sim, era um trabalho rentável. E sempre que o chamavam para uma entrevista de emprego, o despedimento era o que mais real e concreto tinha na sua mente. Claro que este era um assunto que guardava só…
Residência Artística | Raiz
A residência Raiz da qual participei como autor decorreu em Évora, na vila dos Canaviais, durante a qual se semeou o próximo projeto artístico da Associação Artistica Malvada e se definiram dispositivos e processos para a criação de uma Escrita Epistolar, uma Exposição e um Espetáculo, que se realizarão no âmbito do projeto de cruzamento…
Três objectivos de um escritor
Confesso-vos que o meu primeiro objectivo como escritor foi melhorar o meu tipo de letra, e essa secreta intenção de imitar uma escritora famosa cujo tipo de letra invejava. Em parte, alcancei-o sem nunca me libertar, desde logo, de um ligeiro traço de infância na minha escrita, uma irregular tendência para a loucura, um canhestro…
Conexões Itaú Cultural 2021 – Revistas acadêmicas na difusão da literatura brasileira no exterior
No passado dia 9 e 10 de dezembro tive a honra de participar na edição de 2021 do Conexões Itaú Cultural que foi dedicada a refletir sobre a internacionalização de livros e filmes brasileiros – em especial, a divulgação realizada por pesquisas, revistas, editoras e jornalistas. Na mesa 3, Jeremy Lehnen, do Journal of Lusophone studies (EUA); Rebecca Atencio,…
Duas mãos para amparar a queda
Enquanto tento obedecer ao persistente som de uma tecnologia que analisa o meu ciclo do sono, duas tempestades formam-se no pacifico deixando mais de 10.000 pessoas desalojadas. Uma mulher, depois de ser despedida, sobe ao topo do Mont Ventoux só com uma perna. Num país longínquo, um político imagina um muro alto que fere e…
O Homem Que Vendia Revoluções
Às cinco horas e trinta e oito minutos de uma sexta-feira de setembro, um homem entra numa mercearia de bens essenciais para fazer uma compra rotineira. Ao aproximar-se do balcão, o merceeiro, dono do estabelecimento, informa-o num tom aparentemente sáfio: Só vendemos revoluções. O homem, sem hesitar, responde que precisa com urgência de meia dúzia…