No futuro talvez exista uma nova profissão: ouvinte. Mediante pagamento, o ouvinte escutará um outro, atendendo ao que este diga. Recorreremos ao ouvinte porque, excepto ele, não haverá ninguém que nos escute, já que perdemos cada vez mais a nossa capacidade de escutar. É, sobretudo, a insistente focalização no ego, o que torna difícil a escuta. Escutar não é um comportamento passivo, escutar é um prestar, um dar, um dom. Dir-se-á que escutar convida o outro a falar, libertando-o para a sua alteridade. A comunicação digital, enquanto nova forma de produção, elimina rigorosamente toda a distância em proveito da aceleração. Não há limites, tudo se mistura com tudo, reforçando a ausência de escuta. Nós próprios não somos mais do que passagens no núcleo da interconexão global na que a arte de escutar desenvolve-se como uma arte da respiração. O acolhimento hospitaleiro do outro é um inspirar que, no entanto, não o anexa, mas alberga-o e protege-o. A atitude responsável do ouvinte para com o outro manifesta-se como paciência: o ego não é capaz de escutar. O espaço de escuta como caixa de ressonância do ego abre-se quando o mesmo fica em suspenso. Quem se instala somente no interior de si mesmo, quem se fecha em casa, não é capaz de escutar. A casa protege o ego da irrupção do outro. Hoje obtemos informação das redes sem que para isso tenhamos que nos dirigir pessoalmente seja a que interlocutor for. Não temos que nos deslocar ao espaço público para obter notícias ou produtos, a informação vem até nós. A comunicação digital conecta, mas ao mesmo tempo isola. Destrói a distância. É uma comunicação sem vizinho, sem qualquer proximidade de vizinhança. E sem esta, sem escuta, não se configura uma comunidade. Porque a escuta tem uma dimensão política, é uma acção, uma participação activa na existência do outro e, do mesmo modo, na partilha dos seus sofrimentos. Ao perder esta capacidade de escutar o outro, de certo modo, cada um de nós fica a sós com os seus sofrimentos e os seus medos: o sofrimento privatiza-se e individualiza-se. A estratégia de dominação actual consiste em privatizar o sofrimento e o medo, esse que se produz no limiar – “O limiar é uma passagem para o desconhecido” – a partir do qual começa um estado ôntico. Quem transpôe esse limiar submete-se a uma transformação, e como elemento transfigurador, o limiar dói.

* Baseado na obra ensaística de Byung-Chul Han.